CIRCUS MAXIMUS

CIRCUS MAXIMUS

As trinta horas de briguinhas, vexames e escambo que resultaram na eleição de um desconhecido bancado pelo governo à presidência do Senado
O senador Davi Alcolumbre cercado por outros senadores Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo
O senador Davi Alcolumbre cercado por outros senadores Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo

No maior circo espetaculoso de que já se teve notícia na história recente do parlamento brasileiro, o Senado elegeu neste sábado Davi Alcolumbre (DEM-AP) como seu novo presidente após uma votação de mais de sete horas e repleta de discussões. A eleição, com 42 votos, representa uma vitória do correligionário de partido Onyx Lorenzoni, ministro da Casa Civil, que apoiou e articulou a candidatura do senador. A votação também foi uma derrota importante para Renan Calheiros (MDB-AL), seu principal adversário e que já presidiu a Casa anteriormente.

Com a vitória de Alcolumbre no Senado e de Rodrigo Maia para a presidência da Câmara, o DEM passa a ter o comando das duas Casas do Congresso Nacional, além de três ministérios. O partido e as duas presidências serão fundamentais para os planos do presidente Jair Bolsonaro nos dois primeiros anos de seu mandato.

Principal entre eles é a aprovação da reforma da Previdência, item de prioridade máxima do novo governo. As negociações, ainda assim, prometem ser arrastadas. Após sua eleição, o próprio Maia declarou que o debate sobre o assunto deve demorar “no mínimo” dois meses em sua Câmara.

Alcolumbre, que foi derrotado no ano passado na eleição para o governo do Amapá, acabou beneficiado pelo movimento de senadores que não queriam a volta de Renan Calheiros à presidência do Senado. Com uma imagem desgastada na opinião pública, e alvo de 14 inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF), o senador de Alagoas era visto por muitos como um dos representantes da velha política, duramente criticada em manifestações de rua nos últimos anos.

Senadores conversam durante preparação para segunda sessão de votação para presidência do Senado Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo
Senadores conversam durante preparação para segunda sessão de votação para presidência do Senado Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo

Impulsionado pelo apoio governista e da ala de “renovação” do Senado, que teve menor número de reeleitos em sua história, apenas 8, Alcolumbre capitalizou a imagem de opositor de Renan. A saída de Simone Tebet (MDB-MS), Major Olimpio (PSL-SP) e Alvaro Dias (PODE-PR), que também apareciam como opositores ao alagoano, até então favorito, deram musculatura ao democrata, que os agradeceu em seu discurso.

A discussão sobre o modelo de votação, se secreta ou aberta, foi decisiva e deu o tom das confusões que se arrastaram por dois dias, e envolveram muita gritaria, uma votação anulada, cédulas rasgadas, disputas por cadeiras e até uma pasta confiscada.

A avaliação era que a votação secreta beneficiaria Renan. Enquanto o voto aberto poderia afastar votos de senadores que, nos bastidores apoiam Renan, mas não queriam colocar a digital para elegê-lo pela quinta vez presidente da Casa.

Na sexta-feira, por maioria, em sessão comandada por Alcolumbre, os senadores acabaram decidindo por votação aberta, com os votos de cada parlamentar sendo revelado. A senadora Kátia Abreu (PDT-TO) reagiu. Ela gritou para que Alcolumbre abandonasse a presidência da sessão, o interrompeu e chegou a roubar uma pasta de suas mãos. A sessão foi interrompida e remarcada para sábado.

Na madrugada, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli decidiu que a votação deveria ser secreta. A alternativa dos aliados de Davi Alcolumbre, então, foi convencer o Senado a fazer uma votação em cédulas, e incentivar cada parlamentar a mostrar seu voto. Mais confusão. A legalidade desse ato foi questionada, mas não impediu a parte dos parlamentares mostrar a cédula para as câmeras.

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A primeira tentativa de escolher o presidente acabou sendo anulada porque foram contados 82 cédulas para 81 senadores. Alguém votou duas vezes. As cédulas foram rasgadas e uma nova rodada de votação começou. Nessa nova etapa a pressão dos apoiadores de Alcolumbre para que cada senador mostrasse o voto cresceu e deu certo.

Renan Calheiros decidiu, no meio da votação, abandonar a disputa. Ele atribuiu à decisão do PSDB de abrir os votos sua renúncia da disputa pela presidência do Senado. “Tudo o que havia na primeira votação poderia ter repetido na segunda. O que não podia era por pressão o PSDB na segunda votação abrir o voto. Porque a perspectiva que nós tínhamos era de ter 4 votos no PSDB”, afirmou.

“Eles queriam abrir o voto para constranger a maioria e vêm atropelando o Congresso Nacional desde ontem”, acrescentou o senador.

Filho do presidente Jair Bolsonaro, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) também declarou voto em Alcolumbre, ainda que tivesse dito antes, em redes sociais, que não revelaria sua escolha. O motivo? Justamente o parentesco com o presidente da República.

Flavio Bolsonaro dá seu voto Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo
Flavio Bolsonaro dá seu voto Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo

Articulador da candidatura de Alcolumbre, Onyx deixou clara sua comemoração no Twitter. Assim que o resultado foi revelado, o ministro comemorou, citando uma passagem bíblica em que diz: “Davi respondeu: — Você vem contra mim com espada, lança e dardo. Mas eu vou contra você em nome do Senhor Todo-Poderoso, que você desafiou”. E termina citando o principal lema da campanha de Bolsonaro: “Brasil  acima de tudo, Deus acima de todos! Viva o Brasil”.

O governo terá agora um aliado de primeira hora na presidência do Senado. Porém, deve enfrentar a ira de caciques históricos do MDB, que sempre comandaram a Casa — e suas principais comissões — derrotados. Eduardo Braga (AM), Jader Barbalho (PA) e Renan não votaram, além de Maria do Carmo (DEM-SE).

A próxima etapa para o governo e oposição será definir os demais integrantes da Mesa Diretora e, principalmente, quem vai comandar cada uma das comissões, como a de Constituição e Justiça e a de Assuntos Econômicos. São postos fundamentais para o andamento de projetos e da pauta no Senado.

Já Flávio terá que segurar a formação de investigação, no Senado, pelas revelações de relatórios do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

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