CIRCUS MAXIMUS
No maior circo espetaculoso de que já se teve notícia na história recente do parlamento brasileiro, o Senado elegeu neste sábado Davi Alcolumbre (DEM-AP) como seu novo presidente após uma votação de mais de sete horas e repleta de discussões. A eleição, com 42 votos, representa uma vitória do correligionário de partido Onyx Lorenzoni, ministro da Casa Civil, que apoiou e articulou a candidatura do senador. A votação também foi uma derrota importante para Renan Calheiros (MDB-AL), seu principal adversário e que já presidiu a Casa anteriormente.
Com a vitória de Alcolumbre no Senado e de Rodrigo Maia para a presidência da Câmara, o DEM passa a ter o comando das duas Casas do Congresso Nacional, além de três ministérios. O partido e as duas presidências serão fundamentais para os planos do presidente Jair Bolsonaro nos dois primeiros anos de seu mandato.
Principal entre eles é a aprovação da reforma da Previdência, item de prioridade máxima do novo governo. As negociações, ainda assim, prometem ser arrastadas. Após sua eleição, o próprio Maia declarou que o debate sobre o assunto deve demorar “no mínimo” dois meses em sua Câmara.
Alcolumbre, que foi derrotado no ano passado na eleição para o governo do Amapá, acabou beneficiado pelo movimento de senadores que não queriam a volta de Renan Calheiros à presidência do Senado. Com uma imagem desgastada na opinião pública, e alvo de 14 inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF), o senador de Alagoas era visto por muitos como um dos representantes da velha política, duramente criticada em manifestações de rua nos últimos anos.
Impulsionado pelo apoio governista e da ala de “renovação” do Senado, que teve menor número de reeleitos em sua história, apenas 8, Alcolumbre capitalizou a imagem de opositor de Renan. A saída de Simone Tebet (MDB-MS), Major Olimpio (PSL-SP) e Alvaro Dias (PODE-PR), que também apareciam como opositores ao alagoano, até então favorito, deram musculatura ao democrata, que os agradeceu em seu discurso.
A discussão sobre o modelo de votação, se secreta ou aberta, foi decisiva e deu o tom das confusões que se arrastaram por dois dias, e envolveram muita gritaria, uma votação anulada, cédulas rasgadas, disputas por cadeiras e até uma pasta confiscada.
A avaliação era que a votação secreta beneficiaria Renan. Enquanto o voto aberto poderia afastar votos de senadores que, nos bastidores apoiam Renan, mas não queriam colocar a digital para elegê-lo pela quinta vez presidente da Casa.
Na sexta-feira, por maioria, em sessão comandada por Alcolumbre, os senadores acabaram decidindo por votação aberta, com os votos de cada parlamentar sendo revelado. A senadora Kátia Abreu (PDT-TO) reagiu. Ela gritou para que Alcolumbre abandonasse a presidência da sessão, o interrompeu e chegou a roubar uma pasta de suas mãos. A sessão foi interrompida e remarcada para sábado.
Na madrugada, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli decidiu que a votação deveria ser secreta. A alternativa dos aliados de Davi Alcolumbre, então, foi convencer o Senado a fazer uma votação em cédulas, e incentivar cada parlamentar a mostrar seu voto. Mais confusão. A legalidade desse ato foi questionada, mas não impediu a parte dos parlamentares mostrar a cédula para as câmeras.
A primeira tentativa de escolher o presidente acabou sendo anulada porque foram contados 82 cédulas para 81 senadores. Alguém votou duas vezes. As cédulas foram rasgadas e uma nova rodada de votação começou. Nessa nova etapa a pressão dos apoiadores de Alcolumbre para que cada senador mostrasse o voto cresceu e deu certo.
Renan Calheiros decidiu, no meio da votação, abandonar a disputa. Ele atribuiu à decisão do PSDB de abrir os votos sua renúncia da disputa pela presidência do Senado. “Tudo o que havia na primeira votação poderia ter repetido na segunda. O que não podia era por pressão o PSDB na segunda votação abrir o voto. Porque a perspectiva que nós tínhamos era de ter 4 votos no PSDB”, afirmou.
“Eles queriam abrir o voto para constranger a maioria e vêm atropelando o Congresso Nacional desde ontem”, acrescentou o senador.
Filho do presidente Jair Bolsonaro, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) também declarou voto em Alcolumbre, ainda que tivesse dito antes, em redes sociais, que não revelaria sua escolha. O motivo? Justamente o parentesco com o presidente da República.
Articulador da candidatura de Alcolumbre, Onyx deixou clara sua comemoração no Twitter. Assim que o resultado foi revelado, o ministro comemorou, citando uma passagem bíblica em que diz: “Davi respondeu: — Você vem contra mim com espada, lança e dardo. Mas eu vou contra você em nome do Senhor Todo-Poderoso, que você desafiou”. E termina citando o principal lema da campanha de Bolsonaro: “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos! Viva o Brasil”.
O governo terá agora um aliado de primeira hora na presidência do Senado. Porém, deve enfrentar a ira de caciques históricos do MDB, que sempre comandaram a Casa — e suas principais comissões — derrotados. Eduardo Braga (AM), Jader Barbalho (PA) e Renan não votaram, além de Maria do Carmo (DEM-SE).
A próxima etapa para o governo e oposição será definir os demais integrantes da Mesa Diretora e, principalmente, quem vai comandar cada uma das comissões, como a de Constituição e Justiça e a de Assuntos Econômicos. São postos fundamentais para o andamento de projetos e da pauta no Senado.
Já Flávio terá que segurar a formação de investigação, no Senado, pelas revelações de relatórios do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).