De perseguição à ameaça de morte: Cinthia Ribeiro revela desafios enfrentados até a vitória

PREFEITA DE PALMAS

De perseguição à ameaça de morte: Cinthia Ribeiro revela desafios enfrentados até a vitória

Para prefeita, ameaças foi uma tentativa de intimidação.


02/12/2020 15h03 

Cinthia Ribeiro

Prefeita de Palmas desde 2018, quando Carlos Amastha (PSB) deixou o cargo para disputar o governo do estado – e não ganhou -, Cinthia Ribeiro (PSDB) foi a única mulher eleita entre as capitais do Brasil nestas eleições.

Em entrevista ao portal Universa, do UOL, Cinthia relatou os principais desafios enfrentados na campanha e disse que ouviu de uma mesma repórter 13 vezes se tinha condições de seguir no cargo de prefeita. E ouvia diariamente adversários dirigirem-se a ela com frases como “a prefeita da pele macia”.

“Durante toda a campanha, o que eu ouvia eram discussões sobre a cor do cabelo da prefeita, o noivo da prefeita, onde ela come e o que ela faz. Nunca qual era meu melhor plano de governo”, diz. Cinthia é noiva do pastor evangélico Eduardo Mantoan.

“Hoje posso dizer, com conhecimento de causa, que o universo das mulheres nos espaços de poder ainda é algo difícil para a sociedade assimilar. A gente enfrenta um patriarcado, uma misoginia e um machismo muito grandes, que estão arraigados no seio da sociedade.”

Nascida em Anápolis (GO), Cinthia, 43, casou-se aos 23 anos com o então senador João Ribeiro, morto em 2013 vítima de leucemia. Seu único filho, João Antônio, fruto do casamento com o parlamentar, tinha apenas sete anos de idade [hoje tem 13 anos].

Fonoaudióloga, ela conta que era bem claro dentro de casa seu desinteresse em seguir a carreira do companheiro. Após a perda, no entanto, mudou de ideia e decidiu entrar para a política para enfrentar o machismo que passara e que via as poucas mulheres na política enfrentarem também.

“Meu marido morreu no fim de 2013, e vivi algo que não desejo para nenhuma outra mulher. Era como se as pessoas quisessem me enterrar junto com ele, junto com sua história. Era como se eu fosse uma ‘persona non grata’, como se a minha presença e o potencial político fosse ameaça para alguém. Tinha duas opções: ou ficava em casa chorando, comendo e entrando numa depressão sem volta, ou ia para a rua levar o que aprendi fazendo política de bastidores”, ela explica.

“A sociedade cobra que você dê conta de ser pai e mãe, de ser homem e mulher da casa, de ser uma referência para seu filho. João Antônio é órfão desde os sete anos. E o pai teve mais de 32 anos de vida pública. Então, eu olhava para mim e meu filho pequeno e pensava: ‘O que sobrou de tudo isso?’ E as pessoas falando que eu era sozinha, que não ia conseguir tocar família e fazer política. Pensei: “Se eu não entro, outras não vão [entrar] também.”

De perseguição política à ameaça de morte

Então filiada ao PTN (hoje Podemos), legenda que presidiu no Estado em 2014, concorreu naquele ano pela primeira vez como candidata a vice-governadora na chapa de Ataídes Oliveira (PROS), primeiro suplente de seu marido, mas não saiu vitoriosa.

Dois anos depois, já estava filiada ao PSDB, e hoje é presidente do PSDB Mulher Tocantins e presidente estadual da sigla. Chegou a ter seu nome indicado para concorrer à prefeitura em 2016, mas diz que encontrou resistência e acabou saindo como vice de Carlos Amastha.

“As mulheres ainda são a primeira opção para ser a ‘vice alguma coisa’ dos sonhos. Mas, na maior parte das vezes, não são a primeira opção do partido para serem as candidatas que encabeçam a chapa majoritária. Tanto que, em 2016, eu não era a escolha do presidente [regional] do meu próprio partido”, ela fala, referindo-se a Ataídes Oliveira [então no PSDB na época].

Em 2018, inclusive, ele tentou expulsar a prefeita do partido. O motivo seria o apoio declarado dela às candidaturas ao Senado de Vicentino Alves (PR) e Eduardo Gomes (MDB), ante à de Ataídes. Ela teria, com isso, infringido o código de ética do partido, defendendo interesses alheios aos da legenda. Mas ela afirma que foi antes da eleição do diretório de Palmas, por receio dele de que ela assumisse o comando na capital e não o apoiasse.

“Era a mais alta expressão da misoginia, machismo e medo. Eu era bem-vinda como vice na sua chapa em 2014, para organizar o partido, porque ele não conhecia os líderes e o Tocantins, e isso o amedrontava. O apoiei até a última semana de setembro de 2018, quando descobri que ele ainda movia o processo contra mim para expulsão do PSDB”, ela justifica.

Mas Cinthia afirma que a executiva nacional não concordou, e quem acabou saindo da sigla foi ele. E viriam mais demonstrações de preconceito durante a campanha municipal deste ano.

“Um adversário meu ia para as redes falar que eu era a prefeita dos ricos, a prefeita arrumadinha, a prefeita da pele macia. Um pastor ia para a porta do meu prédio dizer que ali só morava gente de classe alta e perguntava se Palmas merecia uma prefeita riquinha.”

“Devido à pandemia, fiquei mais de seis meses sem fazer retoque na raiz do cabelo. Uso mechinhas loiras. E um dia gravei um vídeo no Instagram falando sobre essas mechas. Foi o que mais teve repercussão em plena pandemia. Perguntavam: ‘Nossa, a prefeita está preocupada com a cor do cabelo?'”

Ela passou então a colecionar cada pergunta que julgava ser de cunho machista. Chamou a atenção de Cinthia ter ouvido o mesmo questionamento de uma repórter 13 vezes:

“Ela falava: ‘A senhora se sente preparada para assumir os comandos da capital?’ Eu respondia que sim. E ela insistia. Na 14ª vez, devolvi: ‘Se eu fosse homem, você teria me feito essa pergunta 13 vezes?’ E ela engoliu”, conta a prefeita, que mora com uma amiga, considerada sua filha mais velha, e conta ainda com o apoio da mãe e de duas irmãs para se dividir entre as tarefas domésticas e a vida pública.

Cinthia diz que também recebeu, por mensagens de texto e nas suas redes sociais, ameaças de morte durante a campanha. O caso, ela aponta, é investigado pela polícia. Seu palpite é que sofreu tentativa de intimidação.

Confira a entrevista completa aqui.

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