Denúncias contra João de Deus: 39 brasilienses procuraram MP de Goiás

Denúncias contra João de Deus: 39 brasilienses procuraram MP de Goiás

Entre as vítimas, 23 têm entre 9 e 14 anos. Por causa disso, o médium pode responder por estupro de vulnerável

Igo Estrela/Metrópoles

 

Manoela Albuquerque
Luísa Guimarães

Enviadas especiais a Goiânia (GO) — Desde que o escândalo sexual contra João de Deus veio à tona, o Ministério Público de Goiás recebeu 596 relatos por e-mail sobre o caso, sendo 255 de potenciais vítimas. Desse universo, a maior parte — 40 — é de São Paulo. Em segundo lugar, vem o DF, com 39; 20 casos do Rio Grande do Sul; e Minas Gerais, com 15.

Os promotores divulgaram que 75 mulheres foram ouvidas até agora. A maioria das vítimas tem entre 19 e 67 anos (70 no total). Mas há também 23 delas nas faixas etárias entre 9 e 14 anos, o que pode fazer com que o médium seja denunciado por estupro de vulnerável.

Outras 11 pessoas encaminharam seus relatos de outros países: quatro dos Estados Unidos, três da Austrália, uma da Alemanha, uma da Bélgica, uma da Bolívia e outra da Itália.

Prisão decretada
Nesta sexta-feira (21/12), a Justiça decretou nova prisão de João de Deus. Desta vez, por posse ilegal de armas. Advogado do médium, Alberto Toron disse que a decisão é “desnecessária”, uma vez que João de Deus já está preso preventivamente.

Ele ressaltou ainda que a nova busca e apreensão nos endereços do médium foi “determinada com base em denúncia anônima e foi genérica, o que é inadmissível. Mais. Não se lavrou Auto de Apreensão no local como manda a lei. Portanto, a diligência é írrita”.

A Polícia Civil de Goiás fez novas buscas em endereços ligados a João de Deus. Três imóveis de Abadiânia (GO), no Entorno do Distrito Federal, foram alvos da força-tarefa nesta sexta. Os investigadores encontraram mais uma mala recheada de dinheiro e pedras que parecem ser esmeraldas.

Os policiais ainda não sabem precisar quanto em dinheiro foi achado. Há dentro da mala notas de R$ 50 e R$ 100. Em um dos imóveis, eles encontraram um fundo falso com escada e um cofre no guarda-roupa, sem nada dentro. Delegado-geral de Goiás, André Fernandes disse acreditar que houve retirada de algo que estava nesses compartimentos antes das busca.

No dia 18 de dezembro, a Polícia Civil de Goiás encontrou R$ 400 mil, cinco armas, um simulacro e munição na residência do médium João de Deus, em Abadiânia. O dinheiro estava dividido em notas de euro, dólar, libra, peso e real. Parte do montante foi localizada em fundo falso de um guarda-roupa no quarto do líder espiritual. O armamento estava espalhado em diversos cômodos.

João de Deus foi indiciado nessa quinta (20) por violação sexual mediante fraude. Se condenado, pode pegar até seis anos de cadeia. Ele responde a nove inquéritos. Um foi concluído e outros oito estão em andamento.

Devido às novas apreensões, o delegado André Fernandes afirma que João de Deus deve ser interrogado novamente na próxima semana. Segundo ele, todas as possibilidades de medidas cautelares estão em aberto, mas a interdição da Casa Dom Inácio de Loyola – onde teriam ocorrido os abusos- é improvável de acontecer.

Ele está preso preventivamente desde domingo (16), na penitenciária de Aparecida de Goiânia. O médium foi ouvido no mesmo dia em que se entregou à polícia e pode prestar novo depoimento na próxima semana, por conta das novas apreensões feitas.

Dois voluntários da Casa Dom Inácio também foram ouvidos esta semana. Eles são citados nos depoimentos das 15 vítimas ouvidas na Delegacia Estadual de Investigações Criminais (Deic). Entre elas, Chico Lobo, que atua na administração do centro e é muito próximo a João de Deus.

A polícia não descarta a participação deles nos crimes atribuídos a João de Deus, mas isso está sendo investigado. Ao Metrópoles, Chico Lobo disse não ter conhecimento de que teve o nome citado por vítimas e que não atua na área de atendimento com o médium.

“Cápsulas energizadas recolhidas”
Apontada pelas vítimas como sendo o local onde João de Deus cometia abusos sexuais, a Casa Dom Inácio de Loyola também foi alvo de novas buscas nesta sexta-feira (21). Técnicos da Superintendência de Vigilância em Saúde (Suvisa) fizeram inspeção no laboratório montado no centro de Abadiânia (GO), no Entorno do Distrito Federal.

 

A informação foi confirmada ao Metrópoles pela Secretaria de Saúde de Goiás (SES-GO). “A inspeção foi feita para verificar a qualidade de medicamentos comercializados naquela instituição. No entanto, o trabalho ainda se encontra em fase de coleta. Dessa forma, a Suvisa adianta que só irá se pronunciar após as conclusões das pesquisas e análises realizadas com os produtos”, destacou a nota encaminhada pela pasta. Logo depois, a informação do fechamento do estabelecimento também foi confirmado pela secretaria.

O alvo são as chamadas “cápsulas energizadas”.  No depoimento de seis páginas que prestou na Delegacia Estadual de Investigações Criminais (Deic) de Goiânia (GO) no dia 16 de dezembro, ao qual o Metrópoles teve acesso, João Teixeira de Faria, o João de Deus, 77, admitiu que fabrica remédios em um laboratório na Casa Dom Inácio. Eles são revendidos aos “pacientes” do centro espiritualista.

De acordo com João de Deus, a caixa com 10 comprimidos é comercializada por aproximadamente R$ 50 — o valor, no entanto, pode chegar a R$ 100. “Não tenho certeza do preço. No atendimento, não é repassada a receita. As orientações são repassadas pelo espírito, ou seja, não é de maneira escrita. Apenas atendo e oriento”, afirmou.

Perguntado pelo advogado se ele coage as pessoas a comprar a medicação, disse que não existe qualquer imposição. Alguns até a adquirem mesmo sem “a orientação do espírito”. A força-tarefa da Polícia Civil e do Ministério Público de Goiás fez uma varredura no laboratório nessa terça-feira (18/12).

Por meio de nota, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) destacou que os medicamentos precisam ter o registro da instituição vinculado ao Ministério da Saúde. Quem age de forma contrária comete crime.

“A existência de alvará sanitário ou autorização para funcionamento são de responsabilidade da própria Vigilância Sanitária municipal ou estadual, que possuem autonomia administrativa e são vinculadas às respectivas secretarias de Saúde e responsáveis pela fiscalização e emissão dos respectivos documentos”, destacou o órgão.

A delegada Karla Fernandes, da Deic, informou no dia 19 de dezembro que o laboratório possui alvará de funcionamento. Depois da prisão preventiva de João de Deus, as cápsulas passaram a ser distribuídas gratuitamente. Funcionários da Casa Dom Inácio de Loyola afirmaram ao Estadão que a mudança foi determinada pelo próprio médium, que costumeiramente indicava o remédio manipulado para mais de dois terços dos frequentadores.

Nesta sexta, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli deve julgar o pedido de habeas corpus de João de Deus.

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