Se Bolsonaro não for útil, o Centrão se livra dele

ENTREVISTA
“Se Bolsonaro não for útil, o Centrão se livra dele”, diz cientista político
Cláudio Couto, da FGV-SP, analisa o impacto da vitória de Arthur Lira (PP-AL) e de Rodrigo Pacheco (DEM-MG) à presidência da Câmara e do Senado

2 de fevereiro de 2021
10:09
Rafael Oliveira
“A minha dúvida é: Bolsonaro tem uma agenda? A gente não vê muito claramente esse governo com uma agenda”
“O Centrão é um ‘exército mercenário’, como o Celso Rocha de Barros usou essa expressão. Ou aquela ideia de que o Centrão ninguém compra, só aluga”
“O impeachment depende de impopularidade, crise política, econômica e depende de maioria no Legislativo. Essas situações não estão todas configuradas hoje”
Em entrevista à Agência Pública, o cientista político Cláudio Couto, coordenador do mestrado em Gestão e Políticas Públicas da FGV-SP, analisa o impacto da vitória de Arthur Lira (PP-AL) e de Rodrigo Pacheco (DEM-MG) à presidência da Câmara e do Senado, respectivamente, na noite de ontem (dia 1o). Lira foi eleito contra Baleia Rossi (MDB-SP), com 302 votos, enquanto Pacheco venceu com 57 votos.

Para Couto, que produz o canal de YouTube “Fora da Política não Há Salvação”, a eleição dos dois candidatos apoiados por Bolsonaro ao comando das casas legislativas é, simultaneamente, uma conquista do governo e uma conquista do Centrão. “É uma vitória do governo, na medida em que derrota um adversário que ele tinha na Câmara dos Deputados, muito claramente, que é o Rodrigo Maia. […] Agora, claro que é uma vitória do Centrão, porque os partidos que o compõem, que eu prefiro chamar de ‘partidos de adesão’, são legendas que vão ter mais acesso a recursos governamentais do que tiveram até então”, diz.

Na visão do cientista político, o resultado dá a Bolsonaro a chance de fazer avançar uma agenda que ainda não está clara. “A minha dúvida é: ele tem uma agenda? A gente não vê muito claramente esse governo com uma agenda clara para a economia, uma agenda clara em termos de políticas públicas de um modo geral. A gente tem uma estratégia, em boa medida, destrutiva do governo em certas áreas. Ele desconstrói a área ambiental, a área cultural, a política educacional – que foi longamente construída nos últimos anos –, mas ele não oferece muita coisa para pôr no lugar”, opina.

Em relação aos pedidos de impeachment contra Jair Bolsonaro, Couto considera que Arthur Lira não pautará num primeiro momento. “Mas é claro que, se a situação se deteriorar muito e o Bolsonaro perder muito apelo popular, a pressão que tende a ocorrer sobre o próprio Congresso Nacional – e, especialmente, sobre o presidente da Câmara dos Deputados – tende a aumentar muito. E se os líderes do Centrão perceberem que o Bolsonaro se tornou um peso e, consequentemente, se livrar dele é mais útil, não acho que eles vão ter muito receio de fazer isso”, afirma.

Arquivo pessoal
Cláudio Couto é cientista política e coordena o mestrado em Gestão e Políticas Públicas da FGV-SP
A seguir, os principais trechos da entrevista.

Qual é o peso da eleição da Câmara e do Senado para o cenário político nesse momento?

É uma eleição muito importante por uma série de razões. Primeiro, porque os presidentes dessas casas, e sobretudo o presidente da Câmara, têm um poder de agenda muito considerável. Aquilo que será ou não discutido no âmbito do Congresso depende muito das decisões que esses líderes tomam.

Não só porque eles têm esse poder de definir a pauta – claro que eles fazem isso também negociando com líderes partidários –, mas, no caso da Câmara, todas as propostas de iniciativa do Executivo entram por ela. Se uma medida provisória, se um projeto de lei do Executivo, se uma proposta de emenda à Constituição [é apresentada], tudo isso chega ao Congresso por via da Câmara. Consequentemente, a depender de ter um aliado ou não na presidência da Câmara, aumenta ou diminui o sucesso dessas propostas do governo. Então, é realmente importante, nesse ponto de vista, ter alguém de sua confiança, ou pelo menos alguém com que se tem capacidade de interlocução.

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