O Supremo Tribunal Federal (STF) tem atualmente uma grande oportunidade de reafirmar seu papel de corte constitucional, e não de casa legislativa. Está em curso o julgamento de uma ação na qual, sob o argumento de omissão do Congresso, se pede que o Supremo defina o prazo da licença-paternidade. O caso é paradigmático, pois a própria Constituição fixou o tratamento a ser dado ao tema até que o Legislativo aprove uma lei específica.

Entre os direitos dos trabalhadores, a Constituição incluiu a “licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias”. No caso dos pais, foi assegurada a “licença-paternidade, nos termos fixados em lei”. Ciente dos muitos aspectos sociais e econômicos relacionados ao tema, a Assembleia Constituinte atribuiu ao Congresso a competência de definir o tempo da licença-paternidade. Esse prazo não é, portanto, matéria constitucional, mas tema de livre discussão do Congresso. Entre outras coisas, isso permite que o Legislativo faça ajustes na legislação ao longo do tempo, a depender das circunstâncias concretas de cada época. Não há uma determinação constitucional sobre a matéria.

Mas a Assembleia Constituinte foi além. Para que o direito à licença-paternidade não ficasse refém de uma futura regulamentação, o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias estabeleceu que, “até que a lei venha a disciplinar o disposto no art. 7.º, XIX, da Constituição, o prazo da licença-paternidade a que se refere o inciso é de cinco dias” (art. 10, § 1.º). Com isso, o próprio texto constitucional fixou a solução para a ausência de regulamentação desse direito.

Sendo o papel do STF defender a Constituição, não cabe à Corte dar outra solução que aquela prevista, de forma específica, pelo legislador constituinte. Enquanto o Congresso não aprovar uma lei, o prazo da licença-paternidade é de cinco dias. Não há o que discutir. Qualquer outra medida significaria negar vigência ao texto constitucional, o que é contrário à própria missão da Corte.

As chamadas “omissões legislativas”, usadas muitas vezes como argumento para que o Judiciário entre em matérias do Legislativo, exigem cuidado e parcimônia. O Congresso também se manifesta politicamente ao decidir adiar uma votação ou engavetar um projeto de lei. Não cabe ao Judiciário definir os tempos do Legislativo, já que essa definição é parte essencial da própria política. O silêncio do Congresso é uma opção política perfeitamente legítima, especialmente se a Constituição já deu um encaminhamento para a ausência de regulamentação. Até o momento, a vontade do Congresso foi manter a licença-paternidade em cinco dias.

A Constituição não autoriza que o Judiciário substitua o Legislativo. Os dois remédios constitucionais para uma eventual falta de regulamentação de direitos constitucionais têm requisitos exigentes e consequências determinadas. O mandado de injunção deve ser concedido somente quando “a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania” (art. 5.º, LXXI). No caso de provimento de ação de inconstitucionalidade por omissão, o STF deve tão somente dar “ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias” (art. 103, § 2.º).

Ao dizer que a lei fixará os termos de determinado direito, a Constituição estabelece que se trata de matéria de discussão política do Legislativo, a ser realizada pelos representantes eleitos pelo voto. É um direito da população interferir nesse debate. Não é assunto para ser decidido por juízes que não foram eleitos – e não dispõem de legitimidade constitucional para proferir decisões políticas.

Há no Supremo muitos outros casos similares aos da ação sobre a licença-paternidade. O STF tem o dever de rejeitar essas ações, manifestando assim o necessário respeito pela Constituição, pelo Estado Democrático de Direito e pelos direitos políticos da população.