Comércio economiza R$ 1 bilhão com reforma trabalhista

Comércio economiza R$ 1 bilhão com reforma trabalhista

Estudo da CNC considera ganhos obtidos com a queda do número de processos trabalhistas na Justiça; novas regras que mudaram a CLT entraram em vigor há exatamente um ano

Márcia de Chiara, O Estado de S. Paulo

10 Novembro 2018 | 17h59

As empresas do comércio economizaram neste ano, até agosto, R$ 748,7 milhões em indenizações aos empregados por causa da reforma trabalhista, que entrou em vigor há exatamente um ano, no dia 11 de novembro de 2017. Até o fim deste ano, essa redução de gastos pode chegar a quase R$ 1 bilhão.

Essa é a principal conclusão de estudo da Confederação Nacional do Comércio (CNC) feito para avaliar os impactos do primeiro ano de vigência da reforma trabalhista. “R$ 1 bilhão de redução de gastos com indenizações trabalhistas é muito e pode melhorar o caixa das empresas do comércio”, diz o economista-chefe da CNC, Fabio Bentes, responsável pelo estudo.

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Nova lei trabalhista mudou a CLT em mais de 100 pontos Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Para calcular o corte nas despesas com indenizações, Bentes considerou a retração de mais de 30% neste ano no número de processos trabalhistas e o valor médio das indenizações pagas na Justiça. Também levou em conta o total desembolsado no ano passado pelo comércio com rescisões, que inclui processos que correm na Justiça e acertos feitos diretamente entre empresa e empregado.

Em 2017, o comércio pagou R$ 9,3 bilhões de indenizações trabalhistas, segundo dados do IBGE. Desse total, um terço foi por conta de indenizações pagas na Justiça e dois terços de rescisões fechadas entre empregados e empregadores. “Como a legislação ficou mais flexível, os pagamentos diretos também caíram”, diz Bentes.

O estudo também concluiu que o ganho no salário inicial obtido pelos trabalhadores formais admitidos como intermitentes ou em regime de tempo parcial – modalidades de contrato introduzidas pela reforma – é maior em relação ao salário médio da economia.

Entre abril e setembro, os trabalhadores admitidos em contratos intermitentes iniciaram com salário de R$ 906,82, ligeiramente acima do valor médio do total de admitidos pelo mercado formal no mesmo período (R$ 899,24). No caso de contratos por tempo parcial, a remuneração média foi de R$ 1.004,36, com ganho de 20,5% comparado ao salário recebido por trabalhadores formais com jornadas de 16 a 20 horas semanais.

Os dados são do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho. Bentes avaliou os dados a partir de abril para ter informações mais consistentes, relacionadas a um período de seis meses de vigência da reforma.

“A reforma não frustrou o trabalhador, pelo contrário. Nas novas modalidades de contratos o salário médio foi um pouco maior”, diz Bentes. Ele atribui o ganho na remuneração à economia nos encargos que houve para o empregador ao aplicar as novas modalidades de contratação. Mas, do ponto de vista de geração de vagas, a reforma não engrenou, mostra o estudo. Menos de 1% das vagas formais abertas entre abril e setembro foram intermitentes ou por tempo parcial, situação creditada por Bentes à fraqueza da economia.

Selvagem. O presidente do Sindicato dos Empregados no Comércio de São Paulo, Ricardo Patah, diz que a queda nas ações em razão da insegurança jurídica deve se reverter no próximo ano. A entidade prepara diversas ações coletivas, envolvendo cerca de 5 mil comerciários, e questiona vários itens, como o trabalho intermitente. “Tem uma empresa que contratou intermitentes pagando R$ 4,85 por hora, para período de 5 horas semanais. O trabalhador recebe R$ 100 por mês, mas, se quiser participar do sistema previdenciário tem de recolher R$ 80”, diz. “É uma forma selvagem de contratação.”

O sindicalista, que também preside a central UGT, diz que, apesar de ser contra o que chama de “fábrica de ações”, esse “ganho comemorado de R$ 1 bilhão vai ser evaporado no ano que vem”. / COLABOROU CLEIDE SILVA

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Com queda em ações, advogado mira Previdência

De janeiro a setembro, o número de novos processos trabalhistas no País caiu 36% em relação ao ano passado

Cleide Silva , O Estado de S. Paulo

10 Novembro 2018 | 17h48

Um dos maiores escritórios de advocacia do País a atuar na área trabalhista, o Agamenon Martins, com sede no ABC paulista e escritórios em vários Estados costumava protocolar, em média, 2 mil ações ao mês. No primeiro ano da reforma trabalhista o número caiu à metade. Parte da queda é relacionada ao receio do trabalhador em recorrer à Justiça e, se perder a ação, ter de arcar com o custo do advogado da empresa.

Muitos aguardam definições das altas instâncias do Judiciário, pois há dúvidas sobre a aplicação das novas regras entre os magistrados, diz o sócio do escritório, Agamenon Martins Oliveira. As ações que entram são mais enxutas, sem pedidos considerados “aventureiros” – que não se sustentam juridicamente. “Temos condições de provar tudo que pedimos”, afirma.

TST
Prédio do Tribunal Superior do Trabalho, em Brasília Foto: Estadão

Para compensar a queda de ações na área trabalhista, Oliveira passou a focar a área bancária, principalmente na cobrança abusiva de taxas. Também prepara sua equipe de cerca de 80 advogados para atuar na área previdenciária. “A reforma da Previdência deve gerar grande demanda judiciária”, prevê.

O sócio da área trabalhista do Mattos Filho Advogados, Solon Cunha, diz que a reforma trouxe mais responsabilidade aos advogados de ambos os lados. “Antes era uma espécie de ‘se pegar, pegou’ e havia pedidos malucos.” Segundo ele, demandas como danos morais, “que chegavam à beira da irresponsabilidade”, foram as que mais diminuíram.

“Pedidos exagerados de horas extras e de insalubridade sem provas também diminuíram em razão da sucumbência e dos custos com peritos”, diz Fernando Durão, diretor de Operações Trabalhistas do JBM Advogados. “Há mais cautela e razoabilidade nos processos.”

De janeiro a setembro, o número de novos processos na Justiça caiu 36% ante igual período de 2017. Segundo o Tribunal Superior do Trabalho (TST), foram 1,28 milhão de ações, 726 mil a menos que no ano passado. É o menor número de litígios para o período em 5 anos.

Para Hélio Zylberstajn, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), o conflito entre trabalhador e empresa continua, mas, com o tempo, ambos vão criar meios mais simples para resolvê-lo, “já que a Justiça está mais complicada”.

Empregos. Um dos argumentos para a aprovação da reforma, o de criação de empregos, “não foi atingido”, na visão da advogada trabalhista e professora da Escola Superior de Advocacia da OAB, Ariane Joice dos Santos. “O número de desempregados é muito próximo ao verificado antes da reforma, e isso prova que não é a legislação trabalhista que cria entraves para a contratação”, diz. No fim de 2017, havia 13,4 milhões de desempregados no País e hoje são 12,7 milhões, 5% menos.

Na opinião de José Márcio Camargo, professor de Economia da PUC/Rio, ainda é cedo para avaliar o impacto no nível de emprego, mas ele acredita que a flexibilidade das regras trabalhistas ajudou a diminuir a taxa de desemprego – era 13,7% em 2017 e hoje está em 11,9%.

Outro resultado da reforma foram os 115,8 mil acordos individuais entre empregados e patrões para desligamentos. Já o número de convenções coletivas (negociação do sindicato envolvendo uma categoria) caiu de 3.725 em 2017 para 2.701. Os acordos coletivos (negociação do sindicato com a empresa) caíram de 18.638 para 14.114. As negociações foram mais longas neste ano, informa o diretor técnico do Dieese, Clemente Ganz Lúcio. “Com base na reforma, o empresariado passou a mudar ou retirar cláusulas sociais previstas em acordos anteriores.”

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